segunda-feira, 7 de março de 2016

#Prosa - Negro




Eu olhava-o, admirada com sua beleza, aquela cor que se destacava, aquele gingado que me hipnotizava. Nos amávamos, nos desejávamos, mas estamos sujeitos a separação, a sociedade nos recrimina, eu sou a branca e ele minha melanina. Todas as noites, é nos seus braços que me acalento, jogados nas palhas sujas do estábulo da Casa Grande. Quero fugir, quero me libertar, quero a alforria para nosso amor.

Volto a observá-lo, largando meus pensamentos de lado. Não consigo suportar, a vida foi injusta, pregou-nos uma peça. Eu sabia que ela não era flor e sim perversa.

 Ouça, meus queridos, as lamentações de uma donzela apaixonada. Estava eu e meu amado, aos sussurros e aos abraços, quando suas mãos me arrancaram de seus braços. Lá encontrava-se ela, aquela negra moleca, toda risonha e sapeca. Seu riso escandaloso, acordou toda casa, e aos berros, meu senhor e minha mãe saíram para a sacada. Todos estavam lá, escravos, o capataz, mãe, a moleca e o papai, eu não sabia como reagir, nesse momento o chicote estalou-se sobre a roupa, e com um gemido agudo respondeu meu amado. Quanta dor e sofrimento, eu gritava, sendo arrastada, a moleca ria-se toda desengonçada, e meu amado, ah! Meu amado. Para o tronco era levado.

As doze baladas do relógio da catedral, a senzala estava alvoroçada, o capataz, com aquele sorriso que brilhava, e eu, sabe aonde estava? Sentada em frente a meu amado, obrigada a assistir o quanto o surravam. Meu senhor e minha mãe, me obrigaram a tal sofrimento, e com a última badala veio o lamento, senzala quieta, capataz sorridente, negra moleca era a única que ria da gente. Com um movimento, iniciou o martírio, capataz o xingava de negrinho maldito. Meu Deus, quanta tristeza e humilhação, não podia ficar ali assistindo aquela banalização, e antes que meu pai me segurasse, eu já estava correndo, e junto do meu amado, me joguei, no instante momento o terceiro açoite levei. 

“Pai, afaste dele toda essa dor 
Pai, que não sofras o meu amor
Pai, quero que cai sobre mim este cálice de dor
Pai, eu quero sofrer pelo meu amor. ”

Urrei, depois de minhas preces ao Pai, e esperando pelo quarto açoite, eu gritava por mais. Senti algo úmido e quente, e assim que olhei, era o sangue daquele pobre inocente. Jurei a Deus naquele momento, eu um dia hei de livrar todos desse lamento, e a liberdade em alforria cantará para todos os inocentes que dela precisa.

Meu pai me puxou, e eu gritei para meu amor: “Hoje você apanha por amar simplesmente, mas amanhã serei eu, que apanharei em seu lugar, pois a liberdade do seu povo, eu irei cantar”. Senzala, antes silenciosa, agora rugia em aplausos e gloriosa, e eu, agora estou aqui na janela, depois de ter sido trancada e ver daqui meu amado, apanhar como um condenado, termino minhas lamentações, e agora redijo para vocês, o que enviarei aos chefões:

“LIBERDADE AOS ESCRAVOS, NEGROS, BRANCOS OU MULATOS!
HOJE QUEM VOS ESCREVE, É UMA JOVEM APAIXONADA, QUE SOFRE COM AS INJURIAS DE UMAS SOCIEDADE QUE AMARGA. NÃO PEÇO, MAS VOS ORDENO, QUE AMANHÃ ESSA CARTA SEJA PROPAGADA AOS QUATRO VENTOS, LIBERDADE E RESPEITO AOS NEGROS, E ABDICAÇÃO DO PODER FERRENHO. E AOS QUE MUITOS PERGUNTAM, QUEM ORDENASTE ESSA LOUCURA, DIGA-LHES, ONTEM EU ERA UMA PRINCESA E HOJE UMA CAMPONESA.
ENCERRO AQUI A MINHA CARTA, E ASSINO COM MINHA DEIXA.
ANTES, PRINCESA ISABEL, MAS AGORA ISABELA, VOSSA EX ALTEZA!”


Boa noite meus queridos seguidores. Espero que estejam bem.
Hoje trouxe-lhes algo de minha autoria. Espero que gostem e apreciem!

Nenhum comentário:

Postar um comentário